Modelo de petição | Inépcia; Pedido genérico; Não ocorrência; Valores estimados

PROCESSO nº 0100675-25.2019.5.01.0204 (ROT)

RECORRENTE: XXXXXXXXXXXXX

RECORRIDO: XXXXXXXXXXXXX

RELATOR: ROBERTO NORRIS

 

EMENTA

INÉPCIA. PEDIDO GENÉRICO. NÃO OCORRÊNCIA. VALORES ESTIMADOS. A parte autora já havia atendido ao disposto no §1º do art. 840 da CLT por ter apresentado, desde a peça de ingresso, a estimativa dos valores de seus pedidos, e isto é o que basta, sob pena de restar evidenciado o rigor excessivo, incompatível com os princípios e critérios norteadores desta Justiça Especializada. Recurso provido.

RELATÓRIO

Vistos, relatados e discutidos os presentes elementos de RECURSO ORDINÁRIO, provenientes da MM 4ª Vara do Trabalho no Município de Duque de Caxias, em que são partes: XXXXXXXXXXX, como recorrente, e XXXXXXXXXXXXXXXX., como recorrida.

 

Inconformada com a r. sentença, constante do Id nº 028b74a proferida pela juíza Mauren Xavier Seeling, que julgou extinto o processo sem resolução do mérito, interpõe, a parte autora, Recurso Ordinário, aduzindo as razões constantes do Id nº 072411f.

 

Em resumo, a reclamante insurge-se quanto à extinção do feito sem resolução de mérito, com fundamento no art. 840, §1º, introduzido pela Lei nº 13.467/2017, que exigiria a liquidação dos pedidos. Sustenta que, apesar de determinação judicial, no sentido de que fosse apresentada “emenda substitutiva” à inicial, para apresentar a liquidação dos pedidos, já teria apresentado a inicial com a estimativa dos valores. Aduz que não haveria a obrigação de liquidar os pedidos, mas tão-somente a necessidade de indicar os valores estimados, pelo que pugna pela declaração de nulidade da decisão, com o retorno dos autos à Vara de origem para o regular julgamento do mérito.

 

Custas inexigíveis, ante o deferimento da gratuidade de justiça, em sede de sentença.

Contrarrazões da reclamada, contida no Id nº ee456b6.

 

O feito não foi remetido à Douta Procuradoria do Trabalho, por não ser hipótese de intervenção legal (art. 83, II da Lei Complementar nº. 75/1993), ou regimental (art. 85 do Regimento Interno do TRT da 1ª Região), e/ou das situações arroladas no ofício PRT/1ª Região nº 37/2018, de 18/01/2018, ressalvando o direito de futura manifestação, caso entenda necessário.

 

CONHECIMENTO

 

Conheço do recurso interposto, por preenchidos os pressupostos de admissibilidade.

 

MÉRITO

Indeferimento da Inicial

A reclamante insurge-se quanto à extinção do feito sem resolução de mérito, com fundamento no art. 840, §1º, introduzido pela Lei nº 13.467/2017, que exigiria a liquidação dos pedidos. Sustenta que, apesar de determinação judicial, no sentido de que fosse apresentada “emenda substitutiva” à inicial, para apresentar a liquidação dos pedidos, já teria apresentado a inicial com a estimativa dos valores. Aduz que não haveria a obrigação de liquidar os pedidos, mas tão-somente a necessidade de indicar os valores estimados, pelo que pugna pela declaração de nulidade da decisão, com o retorno dos autos à Vara de origem para o regular julgamento do mérito.

 

Com razão.

 

O juízo a quo julgou o processo extinto, sem resolução de mérito, sob os seguintes fundamentos, constantes do Id n.º 028b74a:

Instada a apresentar a liquidação dos pedidos da inicial, manteve-se inerte a autora.

Observe-se que a autora está aglutinando em um mesmo pedido horas extras e repercussões em diversas rubricas que elenca, sem, contudo, apresentar valor indicativo para cada uma delas o que sequer atenderia ao comando legal, nem mesmo pela análise de indicação do valor por estimativa, como requerido pela reclamante. O mesmo ocorre nos demais pedidos, relacionados ao intervalo intrajornada e adicional noturno, todos com repercussões aglutinadas, sem indicação de valor de forma apartada.

Assim, seja pela falta de liquidação, seja pela falta de estimativa dos pedidos (diferenças de aviso, diferença de férias, diferenças de 13º salário, diferença de FGTS, diferenças de repouso semanal remunerado), tenho por não atendido o comando legal previsto no artigo 840, § 1º, da CLT.

Acrescento que a exigência de indicação dos valores dos pedidos na petição inicial privilegia a ampla defesa, a boa-fé e estimula a conciliação, além de promover maior celeridade processual.

O valor da causa indicado pela autora, de R$ 40.000,00, para o período de tempo em discussão e para a quantidade de pedidos, entre eles, horas extras, adicional noturno e intervalo pleiteados, com as respectivas repercussões, entre outros, não corresponde ao valor total efetivamente pretendido, sendo desproporcional. A disparidade entre a estimativa apresentada na inicial e o real valor em discussão é forma de contornar as alterações legislativas resultantes da Lei 13.467/2017.

Assim, deixou de promover o(a) Autor(a) os atos e diligências que lhe competia, conforme despacho e notificação nos autos, razão pela qual decido EXTINGUIR O PRESENTE PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, em conformidade com o que dispõe o artigo 485, III, do NCPC.

 

Neste aspecto, mostra-se relevante a transcrição da atual redação do art. 840 da CLT, in verbis:

 

“Art. 840 – A reclamação poderá ser escrita ou verbal.

  • 1o Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante.

(…)

  • 3o Os pedidos que não atendam ao disposto no § 1o deste artigo serão julgados extintos sem resolução do mérito.”

 

A exigência de liquidação dos pedidos, antes restrita ao rito sumaríssimo (art. 852-B, I, da CLT), foi estendida ao rito ordinário, como pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo.

 

Desta maneira, quando o juiz verificar que a exordial não atende aos requisitos legais, deve oportunizar à parte que a emende, nos termos do disposto no art. 321 do CPC de 2015:

Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado.

 

Observe-se que, mesmo após o advento da Lei nº 13.467/2017, denominada Reforma Trabalhista, o mencionado dispositivo legal permanece aplicável ao Processo do Trabalho, em razão de lacuna legislativa, e por força do que dispõe o art. 769 da CLT.

 

O referido dispositivo legal representa concreção ao princípio da cooperação, que deve orientar as partes do processo em prol da boa-fé processual, e torna devidos os comportamentos necessários à obtenção de um processo leal e cooperativo. O princípio da cooperação também deve ser aplicado em relação ao órgão jurisdicional e o magistrado tem o dever de apontar as deficiências das postulações das partes, para que possam ser supridas. Trata-se do chamado ‘dever de prevenção’. (Fredie Didier Jr., Curso de Direito Processual Civil, volume 1, 12ª edição, 2010, Editora JusPodivm, pag. 77/81).

 

Neste mesmo sentido, cite-se o seguinte excerto da doutrina de Mauro Schiavi, in A Reforma Trabalhista e o Processo do Trabalho, 2ª edição, LTr, 2018, p.111/112:

“Doravante, o valor da causa passa a ser um requisito da inicial trabalhista, bem como a individualização dos valores de cada pedido. A lei não exige que o pedido esteja devidamente liquidado, com apresentação de cálculos detalhados, mas que indique o valor. De nossa parte, não há necessidade de apresentação de cálculos detalhados, mas que o valor seja justificado, ainda que por estimativa. Isso se justifica, pois o empregado, dificilmente, tem documentos para cálculo de horas extras, diferenças salariais etc. Além disso, muitos cálculos demandam análise da documentação a ser apresentada pela própria reclamada. De outro lado, não há exigência de que a sentença seja líquida, e o procedimento de liquidação por cálculos continua mantido. (…) Os pedidos que não sejam certos, determinados e não estejam com valores individualizados, segundo o § 3 o do art. 840, da CLT, serão extintos sem resolução de mérito. Não se trata de alteração negativa, mas deve ser vista com sensibilidade pelo Judiciário Trabalhista. Antes de extinguir o pedido que não esteja de acordo com o § 1 o do art. 840, da CLT, pensamos ser possível a correção, com atribuição de prazo para emenda (art. 321 do CPC e Súmula n. 263 do TST).”

 

No caso dos autos, o juízo conferiu prazo à parte ré para apresentar a documentação que possibilitasse à parte autora proceder à liquidação dos pedidos, nos termos da decisão contida no id. Nº 3cda2dc.

 

Tendo a ré apresentado a documentação, o juízo de origem determinou que a reclamante apresentasse emenda substitutiva à inicial com a liquidação dos pedidos, nos termos dos despachos contidos nos id. ‘s 6cfce20 e 2323e16, tendo a autora reiterado que a estimativa apresentada em sua peça de ingresso seria o suficiente para atender o disposto no § 1º do art. 840 da CLT (id. Nº 7563c4c).

 

Com efeito, a estimativa dos valores foi apresentada no rol de pedidos (id. nº d15b7de – pp. 17/19) e isto é o que basta, sob pena de restar evidenciado o rigor excessivo, incompatível com os princípios e critérios norteadores desta Justiça Especializada.

 

Neste ponto, convém observar o que a Instrução Normativa nº 41/2018 preceitua em seu art. 12, § 2º, in verbis:

 

“Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT , o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil.”

 

Cumpre observar a jurisprudência deste Regional quanto à possibilidade de apresentar a estimativa dos valores dos pedidos, in verbis:

 

“ARTIGO 840, §1º, DA CLT. De acordo com os princípios da simplicidade e informalidade que regem o processo do trabalho, a interpretação mais adequada do artigo 840, §1º, do CPC é a de que não exige a liquidação dos pedidos, mas a mera atribuição de valor estimativo. Recurso provido.” (Processo nº 0101272.80.2018.501.0025, da Relatoria do Desemb. Leonardo da Silveira Pacheco, publicada em 19/11/2019).

“RECURSO ORDINÁRIO. PETIÇÃO INICIAL. REQUISITOS DO ARTIGO 840, PARÁGRAFO 1º DA CLT. INDICAÇÃO DO VALOR DOS PEDIDOS. O artigo 840, parágrafo primeiro, da CLT, com redação dada pela Lei 13.467/2017 estabelece como requisito de admissibilidade da petição inicial a indicação do valor dos pedidos. Nos termos da Instrução Normativa nº 41/2018 do TST tal indicação pode ser feita por estimativa, não havendo exigência de que os pedidos sejam liquidados.” (Processo nº 0101211.25.2018.501.0025, da Relatoria do Desemb. José Antônio Teixeira da Silva, publicada em 07/11/2019).

 

Assim, dou provimento ao recurso para declarar a nulidade da sentença e determinar a baixa dos autos à Vara de origem para que seja dado prosseguimento à ação com o julgamento do mérito.

 

CONCLUSÃO

 

PELO EXPOSTO, CONHEÇO do recurso interposto e, no mérito, DOU-LHE PROVIMENTO para declarar a nulidade da sentença e determinar a baixa dos autos à Vara de origem para que seja dado prosseguimento à ação com o julgamento do mérito, nos termos da fundamentação.

 

Ficam, desde já, advertidas as partes de que a oposição de embargos de declaração para reapreciação da prova ou para discutir pontos sobre os quais houve expresso pronunciamento do órgão julgador, ainda que contrário ao interesse das partes, configurará intuito protelatório. Essa conduta abusiva da parte atenta contra o princípio da celeridade processual previsto no inciso LXXVIII do art. 5º da CR/88 e autoriza a aplicação pedagógica e inafastável sanção prevista no parágrafo segundo do art. 1.026 do CPC/2015.

 

ACORDAM os Desembargadores da 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região, por unanimidade, CONHECER do recurso interposto e, no mérito, DAR-LHE PROVIMENTO para declarar a nulidade da sentença e determinar a baixa dos autos à Vara de origem para que seja dado prosseguimento à ação com o julgamento do mérito, nos termos da fundamentação.

Ficam, desde já, advertidas as partes de que a oposição de embargos de declaração para reapreciação da prova ou para discutir pontos sobre os quais houve expresso pronunciamento do órgão julgador, ainda que contrário ao interesse das partes, configurará intuito protelatório. Essa conduta abusiva da parte atenta contra o princípio da celeridade processual previsto no inciso LXXVIII do art. 5º da CR/88 e autoriza a aplicação pedagógica e inafastável sanção prevista no parágrafo segundo do art. 1.026 do CPC/2015.

 

Rio de Janeiro, 04 de maio de 2020

ROBERTO NORRIS

Relator